27 março 2021

RETROSPETIVA: «CAPITÃO AMÉRICA: O SOLDADO DO INVERNO»


  Forças sinistras conspiram nas sombras para erigir uma nova ordem mundial. Com o arsenal da democracia prestes a cair em mãos erradas e sem saber em quem confiar, o Sentinela da Liberdade depara-se com um inimigo tão perigoso quanto perturbadoramente familiar.

Título original: Captain America: The Winter Soldier
Ano: 2014
País: Estados Unidos da América
Duração: 136 minutos
Género: Ação / Espionagem / Super-heróis
Produção: Marvel Studios
Realização: Joe e Anthony Russo
Argumento: Christopher Markus e Stephen McFeely
Distribuição: Walt Disney Studios Motion Pictures
Elenco: Chris Evans (Steve Rogers / Capitão América); Scarlett Johansson ( Natasha Romanoff / Viúva Negra); Sebastian Stan ( Bucky Barnes / Soldado do Inverno); Anthony Mackie ( Sam Wilson / Falcão); Robert Redford (Alexander Pierce); Samuel L. Jackson (Nick Fury); Cobie Smulders (Maria Hill); Emily VanCamp (Sharon Carter / Agente 13); Frank Grillo (Brock Rumlow); Hayley Atwell (Peggy Carter)
Orçamento: 170 milhões de dólares
Receitas globais: 714, 4 milhões de dólares

Anatomia de um épico

Aquele que seria o terceiro capítulo da Fase 2 do Universo Cinemático Marvel (MCU, na sigla inglesa) começou a ganhar forma ainda antes de Capitão América: O Primeiro Vingador chegar às salas de cinema. Logo em abril de 2011 - três meses antes da estreia da primeira longa-metragem do Sentinela da Liberdade com a chancela dos Estúdios Marvel -, foi confirmada a recontratação dos argumentistas Christopher Markus e Stephen McFeely para trabalharem na respetiva sequência. 
Inicialmente, Markus e McFeely consideraram inserir na trama múltiplos flashbacks da II Guerra Mundial, mas acabariam por deixar cair a ideia. Em vez disso, resolveram transitar de género: se o primeiro filme fora, em substância, uma história de guerra, o segundo seria um thriller de espionagem ao melhor estilo de John le Carré. Nesse sentido, clássicos como Os Três Dias do Condor (1975) e O Homem da Maratona (1976) serviram como principais influências temáticas e narrativas da estrutura do roteiro.

Os 3 Dias do Condor foi a principal inspiração
 para o segundo filme do Capitão América.

A intenção de Markus e McFeely era confrontar Steve Rogers, eterno soldado e supremo patriota, com os tiques autoritários de uma agência governamental, enfraquecendo dessa forma a sua lealdade para com ela. Perfil que caía como uma luva à SHIELD, habituada a operar em zonas cinzentas, e com a qual o Capitão América vinha colaborando desde o seu "descongelamento". 
Estabelecida a premissa, a dupla de escribas decidiu adaptar a saga The Winter Soldier (O Soldado do Inverno; O Soldado Invernal, no Brasil). Da autoria de Ed Brubaker, a história, publicada originalmente entre setembro de 2005 e abril de 2006, fora aclamada pelos fãs e definira o tom da franquia moderna do Capitão América. Circunstâncias que a tornavam perfeita para uma transição ao celuloide. 
O processo de adaptação revelou-se, todavia, mais difícil do que o previsto e só ao fim de meio ano Markus e McFeely se consideram aptos a executá-lo. Ed Brubaker, por seu lado, ficou encantado com a perspetiva de ver a sua obra transposta ao grande ecrã. E mais empolgado ficou depois de ler o rascunho do guião que, apesar das muitas liberdades poéticas, captava na perfeição a essência da sua trama.

A saga homónima saída da pena de Ed Brubaker.

Durante esse ínterim, os Estúdios Marvel tinham incluído quatro nomes na sua lista de potenciais diretores do projeto: George Nolfi (Ocean's Twelve), F. Gary Gray (Um Golpe em Itália) e os irmãos Anthony e Joe Russo (Eu, Tu e o Emplastro). Descartados os nomes sonantes da Fase 1, como Jon Favreau (Homem de Ferro) ou Keneth Branagh (Thor), a aposta recaía agora sobre uma nova leva de cineastas.
Depois de Gray ter manifestado a sua indisponibilidade para dirigir o projeto, as opções resumiam-se a Nolfi e aos irmãos Russo, com claro favoritismo do primeiro. Surpreendentemente, a escolha incidiria sobre os segundos. Uma opção que deixou alguns fãs apreensivos, uma vez que o currículo dos Russos incluía várias séries cómicas, como Community (de que o CEO dos Estúdios Marvel, Kevin Feige, era grande admirador), e tinham feito o grosso da sua carreira na televisão. 
Todas as dúvidas e rumores se desvaneceriam quando, na San Diego Comic-Con de 2013, a Marvel revelou o título oficial do segundo filme do Capitão América e confirmou os irmãos Russo como realizadores.

A escolha dos irmãos Russo surpreendeu meio mundo.

Com Cleveland como cenário, a rodagem de Capitão América: O Soldado do Inverno arrancou a 1 de abril de 2013. Depois de ter servido de pano de fundo a algumas das mais memoráveis sequências de Os Vingadores (2012), a hospitaleira cidade do Ohio, a troco de generosas benesses fiscais, voltava a acolher uma grande produção dos Estúdios Marvel. 
Em contraste com a turbulenta produção de Thor: O Mundo Sombrio (2013), as filmagens de Capitão América: O Soldado do Inverno decorreram sem sobressaltos, com o respetivo cronograma a ser cumprido na íntegra. Em razão desse elevado nível de eficiência, os irmãos Russo viram ser-lhes confiado não só o capítulo final da trilogia do Sentinela da Liberdade, mas também aquele que foi, até à data, o projeto mais ambicioso do MCU: Vingadores: Ultimato (2018) e Vingadores: Guerra Infinita (2019).
Sob uma revoada de críticas positivas, Capitão América: O Soldado do Inverno fez a sua estreia mundial a 4 de abril de 2014, no mítico El Capitan Theatre de Los Angeles. Duplicando as receitas globais do seu antecessor, seria o sétimo filme mais rentável desse ano e um dos melhores de sempre dentro do  seu género.

Enredo

Dois anos volvidos sobre a épica Batalha de Nova Iorque (eventos narrados no filme Os Vingadores), Steve Rogers vive agora em Washington D.C. e trabalha para a agência de contraespionagem SHIELD enquanto prossegue a sua difícil adaptação ao mundo moderno.
Integrados na equipa STRIKE sob o comando de Brock Rumlow, o Capitão América e a Viúva Negra participam numa operação de resgate em alto-mar. A tripulação de um navio da SHIELD foi sequestrada por piratas liderados pelo mercenário francês Georges Batroc. Durante a intervenção a bordo com vista à libertação dos reféns, o Sentinela da Liberdade descobre que a sua parceira tem uma missão paralela: extrair dados do computador da embarcação, por ordem de Nick Fury.
De regresso ao Triskelion, o quartel-general da SHIELD, o Capitão América confronta Fury, sendo informado por este acerca do projeto Insight: três porta-aviões aéreos em rede com satélites-espiões, projetados para identificar e eliminar preventivamente ameaças à segurança nacional. Repugnado pelo viés fascizante da ideia, o Sentinela da Liberdade expressa a sua veemente discordância relativamente ao que está em preparação. 
Mais tarde, ao falhar em desencriptar os ficheiros obtidos pela Viúva Negra, o próprio Fury começa a ter suspeitas e pede ao Secretário da Segurança Interna, Alexander Pierce, para atrasar o projeto Insight. Pierce compromete-se então a analisar o pedido do diretor da SHIELD.

Alexander Pierce, o todo-poderoso Secretário da Segurança Interna.

Porém, a caminho de um encontro com a agente Maria Hill, Fury é emboscado em plena rua por um grupo fortemente armado e liderado por um misterioso indivíduo com um braço metálico. Apesar de ferido, Fury consegue escapar ao ataque e procura refúgio no apartamento de Steve Rogers.
Fury alerta Rogers para o facto de a SHIELD estar comprometida ao mais alto nível, momentos antes de ser baleado pelo homem com o braço de metal. Antes de desfalecer, Fury entrega a Rogers uma pen drive, instando-o a não confiar em ninguém.
Rogers parte no encalço do atirador, mas este desaparece na noite sem deixar rasto. Horas depois, Fury é dado como morto durante uma cirurgia no hospital e a agente Hill reclama o corpo.
No dia seguinte, o Capitão América é convocado ao Triskelion por Alexander Pierce. Perante a recusa do Sentinela da Liberdade em revelar a informação que lhe foi repassada por Fury, Pierce considera-o um renegado e dá ordens à SHIELD para capturá-lo.
Após uma breve escaramuça com Rumlow e os seus homens, o Capitão América consegue escapar do Triskelion e vai ao encontro da Viúva Negra. Esta revela-lhe que o assassino de Fury é uma figura lendária nos meandros da espionagem internacional; um "fantasma" treinado pelos soviéticos e responsável por dezenas de assassinatos nos últimos 50 anos a quem chamam Soldado do Inverno.


O misterioso e mortífero Soldado do Inverno.

Incapazes de decifrarem os dados da pen drive, o Capitão América e a Viúva Negra descobrem, contudo, a origem dos mesmos: a antiga base militar em Nova Jérsia onde Rogers foi treinado após receber o Soro do Supersoldado.
No interior de um bunker secreto instalado no perímetro da base, a Viúva Negra consegue ativar um supercomputador que contém a consciência preservada de Arnim Zola, um dos mais brilhantes cientistas do III Reich. É através dele que os dois heróis ficam a saber que a HIDRA está incrustada na espinha dorsal  da SHIELD desde a sua fundação, no final da II Guerra Mundial. 
Semeando o caos global, a HIDRA espera pacientemente que a Humanidade troque a sua liberdade por segurança. Zola explica ainda que a pen drive armazena um algoritmo criado por ele, mas não tem tempo de explicar o seu propósito, uma vez que o bunker é atingido por um míssil da SHIELD.
Escapando por milagre ao ataque, o Capitão América e a Viúva Negra são atingidos pela dolorosa evidência de que o líder da HIDRA não é outro senão Alexander Pierce.
Depois de garantirem a ajuda de Sam Wilson, um ex-militar paraquedista com quem Rogers contraíra estreita amizade, o Capitão América e a Viúva Negra interrogam um agente infiltrado da HIDRA. Jasper Sitwell revela-lhes o real propósito do algoritmo desenvolvido por Zola: identificar indivíduos que possam representar ameaça para os planos da HIDRA, sendo a função dos porta-aviões aéreos da SHIELD eliminar esses alvos. 
Longe dali, Pierce convoca o Soldado do Inverno e ordena-lhe que mate o Capitão América e a Viúva Negra.
A caminho do Triskelion, o Capitão América e os seus aliados são atacados pelo Soldado do Inverno, que trata de matar Sitwell em primeiro lugar. Na contenda que se segue, a máscara do vilão cai e o Sentinela da Liberdade, mortificado, reconhece Bucky Barnes, o seu melhor amigo dado como morto desde os últimos dias da II Guerra Mundial. O reconhecimento, porém, não é mútuo e o Soldado do Inverno investe ferozmente sobre o seu adversário.

Um herói que só pode confiar em si mesmo.

O grupo liderado pelo Capitão América acaba capturado pela SHIELD, mas é libertado pouco depois pela agente Hill. Que, em seguida, os leva à presença de Nick Fury. O ex-diretor da SHIELD encenara a própria morte para poder prosseguir sem interferências a sua investigação ao projeto Insight. Sem delongas, apresenta o seu plano para neutralizá-lo: sabotar os porta-aviões aéreos substituindo os respetivos chips de controlo.
Após a chegada dos membros do Conselho de Segurança Mundial ao Triskelion para acompanharem in loco o lançamento dos porta-aviões aéreos, o Capitão América invade o edifício e revela a todos os agentes fiéis à SHIELD que a organização é controlada pela HIDRA.
Disfarçada como uma das conselheiras, a Viúva Negra captura Pierce, que é forçado por Fury a desbloquear o acesso ao banco de dados da SHIELD. Enquanto isso, o Capitão América e o Falcão conseguem sabotar dois dos porta-aviões aéreos, mas ao chegarem ao terceiro são atacados pelo Soldado do Inverno. Com o Falcão fora de combate, o Sentinela da Liberdade luta com Bucky mas recusa-se a matá-lo. Em nome da velha amizade que em tempos os uniu, tenta, em vão, fazê-lo lembrar-se de quem é. 
O Capitão América consegue substituir o último chip, transferindo desse modo o controlo remoto das aeronaves para a agente Hill. Esta faz com que elas disparem umas contra as outras, destruindo-se mutuamente.

O último dos porta-aviões aéreos da SHIELD despenca com um gigantesco pássaro ferido.

Em meio às explosões, Bucky reconhece vagamente algo que lhe é dito pelo Capitão América. Quando este é derrubado da aeronave e cai inconsciente no rio Potomac, é resgatado pelo vilão, que o arrasta para a margem antes de desaparecer como um fantasma.
Com a SHIELD em tumulto, a Viúva Negra participa numa subcomissão do Senado organizada para discutir o futuro da organização. Algures na Europa, Fury, ainda oficialmente morto, procura descobrir a localização das restantes bases secretas da HIDRA. Também Steve Rogers e Sam Wilson seguem o rasto do Soldado do Inverno, usando algumas informações fornecidas pela Viúva Negra.
Numa primeira cena de epílogo, o barão von Strucker proclama que os esforços da HIDRA para impor uma nova ordem mundial irão prosseguir. Strucker observa, em seguida, o Cetro de Loki e dois estranhos prisioneiros: um com velocidade sobre-humana, outra com poderes telecinéticos (os gémeos Mercúrio e Feiticeira Escarlate, respetivamente). Na segunda cena pós-créditos, Bucky Barnes visita o Museu Nacional de História Natural, onde observa um memorial em sua homenagem, reconhecendo finalmente a sua verdadeira identidade.

Trailer


Prémios e nomeações

De um total de meia centena de indicações para galardões sortidos da 7ª Arte - incluindo o Óscar para Melhores Efeitos Visuais - , Capitão América: O Soldado do Inverno saiu vencedor em apenas duas ocasiões. Ao Golden Trailer Award na categoria de Melhor Spot Televisivo acrescentou um prémio especial atribuído anualmente pelos críticos cinematográficos de Washington D.C. à película que melhor representa a capital federal dos EUA.
A título individual, Chris Evans arrecadou o People´s Choice Award para Melhor Ator de Ação. Apesar da parada de estrelas que compunha o elenco, Evans foi o único dos seus representantes a ter a sua atuação premiada.
Na lista dos cem melhores filmes de super-heróis divulgada em 2019 pela Paste - publicação independente especializada em música e entretenimento  - , Capitão América: O Soldado do Inverno surge em 7º lugar, sendo o quarto filme da Marvel mais bem cotado no ranking.


Curiosidades

*Comummente associado à Guerra Fria e ao período passado por Bucky Barnes em animação suspensa com recurso à criogenia, o epíteto Soldado do Inverno remete, de facto, para uma citação de Thomas Paine (1737-1809), um dos Pais Fundadores dos EUA: "Estes são os tempos que põem à prova as almas dos homens. O soldado estival e o patriota ensolarado irão, nesta crise, encolher-se ao serviço do seu país. Mas o soldado do inverno que se apresta a servi-lo, esse é merecedor da gratidão do povo em nome de quem luta.". Do ponto de vista simbólico, o verdadeiro Soldado do Inverno é, pois, o Capitão América, e não Bucky Barnes;
*Organização terrorista internacional de extração fascista, a HIDRA, numa alusão à Hidra de Lerna da mitologia clássica, tem como divisa "Se uma cabeça for cortada, duas nascerão no seu lugar.". Fundada pelo Caveira Vermelha ainda durante a II Guerra Mundial, a HIDRA começou por ser uma excrescência do III Reich - espécie de Estado paralelo fora do controlo do Führer - que sobreviveu à capitulação deste. Sob a liderança do barão Wolfang von Strucker, no pós-guerra a HIDRA converteu-se num sindicato do crime de feição neonazi e deu prossecução às suas atividades subversivas. Nos comics, os seus agentes envergam tradicionalmente uniformes verdes adornados com o símbolo da serpente e praticam a saudação "Hail HIDRA!" de braço direito estendido. Foi em Tales of Suspense #135 (agosto de 1965) que esta sinistra organização fez a sua primeira aparição, numa história assinada por Stan Lee e Jack Kirby. Embora tenha na SHIELD a sua arquirrival, a HIDRA já teve os seus planos de dominação mundial gorados por uma extensa lista de justiceiros fantasiados encabeçada pelo Capitão América;


O barão von Strucker refundou a HIDRA no pós-guerra.

*Sebastian Stan só percebeu a importância do papel que lhe caberia representar quando o título do segundo filme do Capitão América foi formalmente anunciado na San Diego Comic-Con de 2013. A sua  preparação para dar corpo ao Soldado do Inverno incluiu cinco meses de intenso treino físico e pesquisa exaustiva de temas relacionados com a Guerra Fria e lavagem cerebral. Stan aproveitava também as pausas entre filmagens para praticar os seus movimentos de combate com uma faca de plástico;
*Através da sua participação em Capitão América: O Soldado do Inverno, Anthony Mackie cumpriu o sonho de interpretar uma personagem da Casa das Ideias. Nos anos que antecederam o seu escalonamento para o papel de Falcão, o ator entupiu a caixa de correio eletrónico dos Estúdios Marvel com dezenas de emails em que se oferecia para os mais variados papéis. As suas mensagens captaram a atenção de Kevin Feige, o presidente executivo dos Estúdios Marvel, que, por fim, lhe fez a vontade. Mackie ficou no entanto desapontado com o figurino hi-tech da sua personagem, visto que preferia o uniforme de licra vermelha usado pelo Falcão nos quadradinhos. Em resposta às tensões raciais que ciclicamente irrompem na sociedade estadunidense, na viragem da década de 60 o Falcão foi emparelhado com o Capitão América, com quem passaria a dividir a respetiva série mensal. Foi também o primeiro super-herói afro-americano do Universo Marvel;

Na BD, o Falcão foi o parceiro mais duradouro do Capitão América.

*Robert Redford aceitou interpretar Alexander Pierce a pedido dos netos, fãs incondicionais do MCU. A escolha do veterano ator representou, em certa medida, uma homenagem ao seu papel em Os Três Dias do Condor (1975), o thriller de espionagem que mais influenciou a trama de Capitão América: O Soldado do Inverno. Redford ansiava, ademais, pela oportunidade de vestir a pele de um vilão, algo que raramente aconteceu ao longo da sua vetusta e oscarizada carreira;
*Amigos de infância inseparáveis na vida real, Chris Evans e Scarlett Johansson escreveram juntos os próprios diálogos para algumas das partes do filme em que contracenavam. Partiu também de Johansson a ideia de usar em várias cenas um colar com um pendente em forma de flecha. Além da óbvia referência ao Gavião Arqueiro - seu colega nos Vingadores, cuja participação na película chegou a ser equacionada - a joia sugeria um hipotético relacionamento amoroso entre ambos, idêntico ao que em tempos as duas personagens viveram na banda desenhada;
*A cena em que o Capitão América salta de um avião militar a grande altitude sem se preocupar em usar um paraquedas referencia uma cena idêntica do número inaugural de The Ultimates (Os Supremos, versão moderna dos Vingadores). Já o uniforme em tons mais escuros usado pelo herói na primeira metade do filme foi decalcado do modelo por ele utilizado durante a fase em que, nos comics, foi diretor interino da SHIELD;
*Velho inimigo do Capitão América, Batroc, o Saltador - um mercenário francês mestre em  savate -  foi interpretado por Georges St-Pierre, ex-campeão mundial de artes marciais mistas nascido na província canadiana do Québec;

Batroc, o Saltador em ação.

*As filmagens em Washington D.C. tiveram como pano de fundo alguns dos monumentos nacionais mais importantes dos EUA, com destaque para o Memorial Abraham Lincoln, o Capitólio e a Ponte Theodore Roosevelt. Esta última foi encerrada pela primeira vez na sua história para acolher a gravação de um filme;
*Elizabeth Olsen foi uma das atrizes cogitadas para interpretar Sharon Carter, antigo interesse amoroso do Capitão América nos quadradinhos. Apesar de o papel ter sido atribuído a Emily VanCamp, Olsen surgiu numa das cenas de epílogo como Wanda Maximoff, a Feiticeira Escarlate;
*Além do inevitável Stan Lee, também Ed Brubaker, autor da saga homónima em que o filme foi baseado, fez um pequeno cameo: era ele um dos cientistas que testemunharam a apresentação do Soldado do Inverno num bunker secreto;
*Antes do lançamento do filme, havia algumas dúvidas acerca do apelo que ele teria fora dos Estados Unidos, atendendo à circunstância de ter como protagonista um símbolo do patriotismo yankee. No entanto, Capitão América: O Soldado do Inverno obteve enorme êxito além-fronteiras. Surpreendentemente, foi na China que teve melhor acolhimento. Ao que parece, as aventuras de um super-herói disposto a desafiar o seu Governo quando o considera moralmente necessário mostraram-se particularmente atrativas para os cidadãos de uma nação com um regime autoritário;

O Sentinela da Liberdade é idolatrado mesmo pelos rivais dos EUA.


Veredito: 86%

À terceira foi de vez. Após duas partidas em falso (Thor: O Mundo Sombrio e, sobretudo, Homem de Ferro 3), a Fase 2 do MCU acertou o passo com Capitão América: O Soldado do Inverno. Os fãs puderam respirar de alívio com um filme que, além de épico, abriu caminho para o futuro. 
Apesar do título sugerir o contrário, Capitão América: O Soldado do Inverno não adapta apenas uma das melhores sagas do Sentinela da Liberdade; transpõe toda a respetiva ambientação e estilo narrativo. O próprio Soldado do Inverno, visualmente fiel aos quadradinhos, não é a personagem charneira da trama, antes uma peça importante de uma engrenagem muito maior. 
Sólida e cativante, a trama de Capitão América: O Soldado do Inverno faz inveja a muitos filmes de espionagem. Sem grandes falhas a nível de argumento e com uma toada empolgante - alternando entre sequências frenéticas e momentos mais calmos - a película é um autêntico festival de ação. O que não impediu o bom tratamento concedido a novas personagens, especificamente a Alexander Pierce e ao Falcão. Mesmo sem funcionar como um alívio cómico, este último proporciona alguns dos momentos mais divertidos da história. 
Com efeito, o humor típico da saga volta a destacar-se sem, contudo, cair nos exageros de capítulos anteriores. Do mesmo modo que o bromance entre Steve Rogers e Sam Wilson não resvala para um perturbante homoerotismo. 
No que respeita aos aspetos visuais, a película merece também rasgados elogios. Aos soberbos efeitos especiais - pedra de toque do MCU - acrescem vibrantes cenas de ação e lutas corpo a corpo muito bem coreografadas. O duelo inicial entre o Capitão América e Batroc é sensacional, perdendo apenas na comparação  com as cenas de luta envolvendo o Soldado do Inverno.
Lamentavelmente, esse nível elevado acaba por sair beliscado por aquele que é um dos pontos fracos do filme: a sequência final a bordo dos porta-aviões aéreos da SHIELD. Após tanta criatividade e emoção, custa a engolir a solução genérica de apertar um botão para neutralizar a ameaça. Ficando também a sensação de que o Soldado do Inverno poderia - e deveria - ter tido um papel mais grandioso no clímax.
De resto, a história está pejada de easter-eggs: de menções a personagens novas a locais icónicos do Universo Marvel, são muitas as pequenas preciosidades a fazerem as delícias dos verdadeiros fãs da Casa das Ideias. 
Motivos de sobra para considerar Capitão América: O Soldado do Inverno, ex aequo com Os Vingadores, o melhor filme do MCU. Que me perdoem os fãs da Saga do Infinito, mas prefiro boas tramas a produções megalómanas.

O verdadeiro Soldado do Inverno é aquele
 que não se submete à tirania nem perde a esperança
em tempos sombrios.


*Este blogue tem como Guia de Estilo o Acordo Ortográfico de 1990 aplicado à norma europeia da Língua Portuguesa.
*Artigos sobre a Viúva Negra e o filme dos Vingadores disponíveis para leitura complementar.















3 comentários:

  1. Mais um texto excelente, com uma particularidade: se não me falha a memória, entre os textos que li, é o primeiro em que o autor deixa transparecer seu gosto pessoal (todo gosto é, em última instância, pessoal - essa que usei é mais uma daquelas expressões sem sentido). Embora eu não partilhe do entusiasmo dele pelo filme, respeito sua opinião como se minha fosse.

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  2. Texto esclarecedor que fez rever mentalmente o filme. "O verdadeiro Soldado do Inverno é aquele que não se submete à tirania nem perde a esperança em tempos sombrios.", brilhante observação.

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  3. É verdade: trata-se de um dos melhores episódios do MCU. Depois desse, na comparação, Guerra Civil acabou me fazendo perder o interesse em acompanhar os demais filmes.
    Parabéns pelo texto muito bem escrito e cheio de surpresas e curiosidades.

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