28 outubro 2015

ETERNOS: JIM APARO (1932-2005)




   Diletante da 9ª arte, inscreveu o seu nome em letras douradas na história da DC Comics, para a qual criou várias personagens de relevo. Reverenciado por fãs e colegas de ofício, o seu traço ficará para sempre associado a algumas das mais memoráveis sagas do Cavaleiro das Trevas.

Biografia e carreira: No dia 24 de agosto de 1932, a pequena cidade de New Britain, no estado norte-americano do Connecticut, viu nascer um dos seus mais ilustres habitantes. James N. Aparo, de cuja vida familiar quase nada se sabe, cedo se interessou pela arte do desenho, revelando possuir um talento inato nesse campo. 
  Autodidata, por volta dos 20 anos tentou a sua sorte na indústria dos quadradinhos, submetendo o seu portfólio à apreciação dos editores da EC Comics. Aqueles não ficaram, no entanto, particularmente impressionados e recusaram contratá-lo. Face a este revés, o jovem Aparo voltou-se para o ramo publicitário. Sem nunca desistir do seu sonho de ter uma carreira ligada à 9ª arte, nas décadas seguintes especializar-se-ia em desenhar anúncios de moda a serem publicados nos tabloides.
  Corria o ano de 1963, quando Aparo teve nova oportunidade para mostrar o seu valor artístico. Por essa altura foi convidado a desenhar Stern Wheeler, uma tira escrita por Ralph Kanna e publicada num jornal de Hartford - cidade também localizada no Connecticut para onde o artista se mudara com a família. Apesar de efémera, a experiência teve o condão de projetar o trabalho desenvolvido por Aparo. 
  Em 1966, Dick Giordano (então editor-chefe da Charlton Comics) contratou Jim Aparo como ilustrador freelancer. Funções que desempenhou inicialmente em historietas humorísticas publicadas na série Go-Go Comics. Algum tempo depois assumiria, porém, a arte do Fantasma ( herói clássico criado em 1936 por Lee Falk), cujos direitos de publicação eram à época propriedade da Charlton. Ao longo desta sua passagem pela editora que deu a conhecer ao mundo personagens como o Capitão Átomo e o Besouro Azul, Aparo desdobrou-se numa grande variedade de géneros: tanto emprestava o seu traço a westerns como a histórias de ficção científica, romance ou espionagem. Uma das séries onde, de resto, mais sobressaiu o seu talento foi James Bond.

O mais famoso dos agentes secretos britânicos pelo traço de Jim Aparo.

  Embora o grosso do seu trabalho tenha consistido na ilustração de pequenas narrativas incluídas em títulos antológicos da Charlton, Aparo desenhou igualmente a quadrinização das tiras do Fantasma e histórias avulso do Capitão Átomo.
  À versatilidade, Aparo aliava uma admirável capacidade de trabalho. Tanto assim que era um dos poucos artistas na indústria dos quadradinhos que acumulava as funções de arte-finalista, colorista - e até letrista - com as de ilustrador. 
  Quando, em 1968, Dick Giordano trocou a Charlton pela DC, fez questão que Jim Aparo o acompanhasse nessa mudança. Oferecendo-lhe, para isso, um emprego como desenhador de uma das personagens de charneira da Editora das Lendas: ninguém menos do que Aquaman. Aparo aceitou de bom grado a oferta, negando-se, porém, a desertar da Charlton.
 Confirmando o seu enorme arcaboiço profissional, nos primeiros tempos - e graças à periodicidade bimestral dos dois títulos por cuja arte era agora responsável - Aparo conseguiu conciliar o seu trabalho em ambas as editoras.
 À semelhança do que fazia na Charlton, Aparo distinguir-se-ia na DC pela sua polivalência ao desenhar, arte-finalizar e colorir as aventuras do Soberano dos Sete Mares. Em consequência do sucesso comercial destas, a DC contratou-o para ilustrar também as histórias do Vingador Fantasma. Circunstância que motivaria a sua saída definitiva da Charlton. 
 Todavia, na sequência do cancelamento de Aquaman, a periodicidade bimestral de Phantom Stranger revelou-se insuficiente para satisfazer o afã criativo de Aparo, rotinado em produzir uma página por dia. A DC adjudicou-lhe então pequenas empreitadas artísticas em títulos como House of Mistery e House of Secrets.
  Consta que, por esses dias, Carmine Infantino (então editor-chefe da DC) o terá pressionado a aumentar o número de páginas produzidas. Ao que Aparo terá simplesmente retrucado se ele preferia um trabalho rápido ou de qualidade. Tanto quanto se sabe, Infantino terá escolhido a segunda opção.
  No início da década de 1970, Jim Aparo assumiu a arte de The Brave and the Bold, uma das mais emblemáticas séries regulares da DC. Seria, de resto, nela que levaria a cabo um dos mais meritórios trabalhos da sua prolixa carreira.

Umas das muitas capas de The Brave and the Bold desenhadas por Aparo.

  Durante mais de uma década, a periodicidade bimestral de The Brave and the Bold permitiu a Jim Aparo desenvolver diversos projetos paralelos para a DC. Ao mesmo tempo que se assumia com um dos capistas de referência da editora, emprestou o seu traço às histórias do Espectro e de um renovado Aquaman em Adventure Comics. A sua consagração definitiva seria, porém, alcançada por via do trabalho executado nas histórias a solo de Batman em  Detective Comics. Título cuja arte tomou a seu cargo em outubro de 1973, iniciando assim uma duradoura ligação ao universo do Cavaleiro das Trevas.
 À medida que os anos foram passando, foi-se estreitando essa conexão. Quando, em 1980, a DC apostou na primeira minissérie do Homem-Morcego, coube a Aparo arte-finalizar os esboços de John Byrne no primeiro número, assumindo ele próprio a ilustração dos restantes.
  Entretanto, em 1983, foi anunciado o cancelamento de The Brave and the Bold ao fim de duas centenas de edições. No seu lugar surgiu Batman and the Outsiders. Celebrizados junto do público lusófono como Renegados, tratava-se de um grupo de heróis chefiado pelo Homem-Morcego que operava na semiclandestinidade. Com o escritor Mike W. Barr, Jim Aparo foi coautor daquela que seria, nos alvores dos anos 1980, uma das mais bem-sucedidas séries da DC. No entanto, quando o fulgor de Outsiders (agora já sem Batman no elenco) se começou a desvanecer, os editores pediram a Aparo que assegurasse apenas a ilustração das histórias. Interrompendo dessa forma a tradição de o artista colorir e arte-finalizar o seu próprio trabalho.

Batman and the Outsiders foi uma das coqueluches da DC no início dos anos 80.
Metade dos membros da equipa (Katana, Halo e Geoforça) foram criados por Jim Aparo.

  Agora em colaboração com o escritor Jim Starlin (perfil já publicado neste blogue), em dezembro de 1987, Aparo reassumiu a arte de Batman. Um dos primeiros arcos narrativos produzidos por esse verdadeiro duo dinâmico da 9ª arte foi Ten Nights of the Beast, no qual foi introduzido o KGBesta. Antigo agente especial do KGB soviético treinado para ser uma arma mortífera, esta personagem tornar-se-ia nos anos seguintes um dos mais temíveis adversários do Homem-Morcego.
  Mantendo intacto o seu vínculo ao universo do Cavaleiro das Trevas, o nome de Jim Aparo ficará para sempre associado a duas das mais impactantes sagas protagonizadas pelo herói: A Death in the Family (1988-89) e Knight Fall (1993-94). Recorde-se que, na primeira, é apresentada a morte do Robin Jason Todd, ao passo que a  segunda tem na capitualação de Batman às mãos de Bane o seu clímax. Recorde-se, também, que ambas já foram objeto de análise neste blogue.
  Após um breve período em que Aparo voltou a acumular as funções de desenhador, arte-finalista e colorista nas histórias do Batman, em 1992 assumiria pela última vez a arte de uma série regular da DC. Em Green Lantern (título em que trabalhou ao longo de 19 edições), ele e o argumentista Kelley Puckett criaram Conner Hawk, o filho do Arqueiro Verde que substituiu temporariamente o herói original dado como morto.
  Entre os finais da década de 1990 e os primeiros anos deste século, o trabalho de Jim Aparo consistiu fundamentalmente na ilustração de minisséries e edições especiais estreladas pelo Batman. Personagem pela qual o artista sempre demonstrou um enorme carinho e respeito. Não sendo, portanto, surpreendente que o seu canto do cisne nos meandros da 9ª arte se haja materializado na ilustração da capa de Batman in the Eighties, antologia de algumas das melhores histórias do Homem-Morcego na década de 80. Obra levada à estampa em 2004, dois anos antes da publicação póstuma da arte de Aparo para o final alternativo de A Death in the Family em Batman Annual nº25.

Batman depara-se com o corpo sem vida do Menino-Prodígio em A Death in the Family (Morte na Família).

  Antes,  no dia 19 de julho de 2005, Aparo deixara mais pobre o mundo da banda desenhada com a sua morte. Cujas causas não são até hoje consensuais: algumas fontes atribuem-na a uma batalha perdida contra um cancro, embora no comunicado oficial emitido pela família do artista seja feita referência a uma doença recente não especificada. Seja como for, num gesto de homenagem e gratidão reservado apenas àqueles que se tornaram lendas ao seu serviço, a DC dedicou duas páginas à memória de Jim Aparo publicadas em Batman nº644 e Detective Comics nº811. Porque, bem vistas as coisas, a imortalidade mais não é do que um terreno disputado ao esquecimento. E Jim Aparo viverá para sempre na memória de quem venera o seu extraordinário legado.
 
Autorretrato caricaturado de Jim Aparo.
    
Prémios e distinções: Apesar da longevidade e do prestígio da sua carreira artística, foram somente dois os prémios arrecadados por Jim Aparo. O primeiro, um Shazam Award para Melhor História Dramática, foi dividido em 1972 com o escritor John Albano. Na origem dessa distinção esteve The Demon Within, pequena narrativa publicada em House of Mistery nº201.
  Mais de duas décadas volvidas, em 1993, conquistaria outro importante galardão. Desta feita um Inkpot Award, prémio anual reservado a profissionais ligados à banda desenhada, animação e ficção científica.
  Nada mal para um diletante da 9ª arte que subiu a pulso na competitiva indústria dos comics, e cujo incontestável talento é ainda hoje uma referência para outros desenhadores ou aspirantes a tal.

Um grande senhor da 9ª arte.